A ordem nunca produziu nada, além de réplicas. O novo,
para nascer, precisa do caos. Qualquer nascimento, é necessariamente
conturbado. Desde uma planta, a um poema; desde uma criança, à uma descoberta
científica. A vida é caótica por natureza.
Milhares de anos atrás, o elemento fogo foi percebido pelo Homem, e
usado como instrumento. E esse achado mudou totalmente o nosso modo de agir, de
pensar, de comer, e modificou inclusive o nosso corpo – já que agora a carne
passou a ser assada, e tornou-se macia. Portanto, mais fácil de ser mastigada.
Acabou a necessidade de mandíbulas tão protuberantes -. Além de modificar o
aparelho digestório. O fogo, que hoje sai de um simples aperto no botão de um
isqueiro, ontem, foi originário de uma revolução. Ele não existia só para os
humanos, mas também para os outros animais. Porém, o caos da natureza, que para
os outros animais, é ordem, para nós, é revolução.
Apenas nós vemos, e muitas vezes,
criamos o extraordinário. Para eles, sempre mais do mesmo. Nós até nos
deslumbramos com a “simples” metamorfose da lagarta que vira borboleta. Apesar
de ser de fato fascinante, é comum. Acontece aos montes. Incomuns são as obras
de Niemeyer; os bonecos de Vitalino; os escritos de João Cabral de Melo Neto;
as sinfonias de Bethoven... A lista não cabe em papel. Mas por que a
metamorfose da borboleta tanto nos fascina?
Com a presença do fogo, o Homem
perdeu um denominador com a todos a todos os outros animais: O Predador! Sem
ele, passamos a habitar o topo da cadeia alimentar, e sermos o vilão de
qualquer historinha de ninar contado pela mamãe urso, aos seus filhinhos.
O fogo virou arma, proporcionou a
criação de instrumentos de caça melhores, e em consequência disso, a briga
deixou de ser pela mera sobrevivência diária. Passamos a planejar o amanhã. Sem
predadores, não há a necessidade de locomoção em curtos intervalos de tempo.
Deixamos de ser nômades, e tivemos um aumento populacional. A briga passou a
ser pelo território. A agricultura, recém nascida, precisava de terras férteis
e irrigação, para gerar seus frutos. Os humanos, recém estabilizados,
precisavam de armas para garantir que isso acontecesse. Aconteceu!
Fortificamos nossos abrigos;
domesticamos animais; expandimos nosso território, e pouco a pouco, modificamos
a natureza. Incontáveis foram as guerras. E veja que absurdo: uma luta
interespécie, tornou-se também, intra. Nos tornamos o “vizinho chato” que briga
com todo mundo. Instauramos o caos, onde tudo era ordem( por mais conturbada
que fosse). Nos tornamos donos do mundo, porém, perdemos nossa parte mundana.
É inegável que a humanidade evoluiu
em diferentes aspectos ao longo dos milênios. É inegável que as guerra
trouxeram avanços. É inegável que o caos também trás o progresso. Mudanças
surgem necessariamente de crises. É comum nos sentirmos bem ao estarmos em
contato com a natureza, respirando ar puro, tomando banho em rios, subindo em
árvores, e pisando descalço na areia fofa da praia, ou no chão de barro. Há uma
“religação”. Algo talvez de ordem espiritual. O problema é que esquecemos que
também seríamos “mais do mesmo”, se não fosse o raciocínio.
Ps.:
peguei o título emprestado do Chico Science
– Carlos I. Gomes.